24 de janeiro de 2010

Ressaca

Acordou eram mais de 3 h da tarde. Normal para quem foi dormir as 6 h da amanhã. Mal abriu os olhos, a claridade era incomoda demais. Ao se levantar sentiu como se um peso de 20 kg esmagasse sua cabeça e na mesma hora sentiu o estômago embrulhar. Como um mantra que já repetia todas as manhãs, jurou nesse momento que nunca mais ia beber, fumar, cheirar, ou fazer qualquer coisa do gênero, condenou até a terceira geração daqueles que a levaram ao bar, apanhou alguns remédios e foi até a cozinha para bebê-los. Por lá, mudou de idéia, ou melhor, literalmente, bebeu. "Já que está tudo uma droga mesmo, vou tomar um vinho". Vinho e comprimidos, que mal poderia fazer? Naquele momento nada soava pior que aquela maldita ressaca.

Sentou-se, pegou logo três comprimidos e tomou. Sobre a mesa algumas contas, a maioria delas atrasada, não por falta de dinheiro para pagar, mas por falta de disposição em sair sob aquele sol escaldante. Há algum tempo não saia de casa senão a noite, se recusava a ver a luz do dia, a menos que tivesse um bom motivo, e como pagar o aluguel do apartamento, a conta de água e a do celular não lhe parecia um bom motivo... “Sol e ressaca não é uma boa combinação”, pensou. “Sol, ressaca, vinho, comprimidos e um carro é uma combinação ainda pior”, concluiu.

Resolveu tomar um banho. Se levantou, foi até o banheiro e começou a tirar sua roupa. Ainda com o vestido preto que usou na noite anterior e o rosto borrado pela maquiagem, se olhou no espelho e não se conteve, riu. "Só falta começar a cobrar...", pensou. Tirou o vestido e percebeu que não havia mais o que tirar. "Quem se importa?", pensou. Abriu o chuveiro e por lá ficou alguns minutos. Desejou que a água entrasse por sua cabeça, lavasse o cérebro e aliviasse a dor. Infelizmente, não aconteceu. Ficaria ali a tarde toda se o celular não tivesse tocado. Já quase dormindo sob o chuveiro, meio desnorteada apanhou a toalha, mal se enrolou e saiu. Antes de atender viu que era ele, e sendo ele não tinha como não atender.

O marido estava sempre viajando, algumas vezes ficava o mês todo fora de casa. Triste em ficar sozinha, ela acabou fazendo amigos e passando as noites com eles para se divertir. O marido de nada sabia, ou fingia que não, mas também, estava sempre ocupado demais, se não com as viagens, mas com a secretária, para pensar no que sua mulher fazia ou deixava de fazer. Atendeu ao telefone, falou com ele como a esposa amorosa e fiel que se fazia ser, justificou a voz um tanto alterada como resultado de uma enxaqueca que não a deixara dormir, desligou, e foi terminar seu banho. O marido queria avisar que demoraria mais uma semana, queria saber se ela precisava de algo ou se tinha alguma coisa para lhe dizer. Nessas horas ela até desconfiava que ele soubesse, mas se mantinha tranquila e sempre dizia "Lógico que tenho algo para te dizer... preciso dizer que te amo, meu querido". Ele fingia que aquilo era o que mais gostava de ouvir, ela fingia que aquilo era o que mais gostava de falar, e ficava tudo bem.

Depois do banho se vestiu, ligou para um de seus amigos e o convidou para um passeio, por sua conta, ou melhor, por conta do seu marido. Saíram, e com ele se divertiu muito em mais uma de suas noites "solitárias" de sábado.

No outro dia acordou eram quase 2 horas da tarde, mas também pudera, foi dormir eram quase 6 horas da manhã...

6 comentários:

Mariana Andrade. disse...

o ser humano tem morte agonizante.
o dia todo, e todos os dias.

seguindo também, querida (;

Angel disse...

Ei, Mariana, que bom tê-la aqui!

Abraços, e volte mais vezes.

Jacque disse...

Conheço uma história parecida... que não era nada ficcional, mas, que terminou muito bem, muito mesmo.

Ei, você manda muito bem em contos!

Um beijo, Angel!

Angel disse...

Ei, Jacque, ainda bem que esta história ai que você conhece, bem real, terminou bem! Há fases ruins, e cada um tem força suficiente para reagir diante das suas.

Obrigada pelo carinho, querida Jacque!

Abraços!

Luís Gonçalves Ferreira disse...

Essa lógica de deitar tarde e tarde acordar faz-me recordar aqui a minha pessoa.

Infelizmente, há muitas pessoas que não conseguem terminar com felicidade as suas histórias quotidianas. Este condão de retratar uma realidade que nos é familiar é coisa para poucas pessoas.
Obrigado por este bocadinho. E sim, como diz a Jacque, tem muito muito jeito para escrever contos.

Um beijo, Angel :D

Angel disse...

Ei, Luís, muito obrigada pelo carinho, me fazem muito feliz.

Abraço, meu amigo!

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